Solidão ou solitude?
Normalmente atribuímos significado negativo à introversão e positivo à extroversão, afinal vivemos em sociedade, sendo inviável não ser sociável, certo? No entanto, segundo Carl Jung, fundador da Psicologia Analítica, ambas as características citadas não passam de traços psicológicos, que, ao mesmo tempo, são universais a todos nós. Definiu “introversão como a predominância em se preocupar com a interioridade, enquanto extroversão seria o contrário: predominância em se preocupar com a exterioridade”*. Nesse sentido, idealizou uma escala introvertido-extrovertido para que fosse possível salientar certos comportamentos a determinado tipo de personalidade, afinal, ainda conforme os seus dizeres, não existem pessoas somente introvertidas ou somente extrovertidas. Obviamente, estudos acerca do assunto são os verdadeiros responsáveis pelas proposições supracitadas, enquanto que o psicólogo Hans Eysenck, a partir dos resultados de mais uma dessas pesquisas, estabeleceu que a “relação entre extroversão e introversão estaria associada ao modo no qual o cérebro reage a estímulos, sendo que indivíduos extrovertidos seriam naturalmente sub-estimulados, e, devido a essa particularidade, ganhariam energia através de interação social e teriam a tendência de assumir riscos”*, entre outros comportamentos característicos. Em contrapartida, “sujeitos introvertidos seriam facilmente estimulados, portanto contato humano em demasia poderia resultar em exaustão ou em algum desequilíbrio mental”*; assim sendo, atividades "solitárias" ou interações focalizadas estariam suficientemente aptas para suprir a necessidade de "satisfação", por assim dizer.
*retirado de: https://psicoativo.com/2017/01/psicologia-introversao-extroversao.html
A crença popular insiste em relacionar introversão com timidez, o que não é propriamente correto, embora a confusão quanto aos dois termos seja compreensível. Timidez pode ser definida como o ato de se privar de algo pela repercussão que isso talvez gere: medo por antecipação, basicamente. Trata-se de desconforto social devido ao receio de que algo vergonhoso aconteça, enquanto que introversão consiste em simplesmente não suportar tais ocasiões, mas sem julgamentos concernentes à ansiedade. Ou seja, por mais que os resultados sejam de alguma forma equivalentes, as motivações são totalmente divergentes, e isso faz toda a diferença nesse cenário em específico. Alguém tímido, porém não necessariamente introvertido, presumivelmente não aceitaria um convite a uma festa, por exemplo, porque o pensamento de ir a um evento desses despertaria angústia devido a alguma gafe social que pudesse vir a cometer. Não se sentiria à vontade baseando-se em pura ansiedade, ao passo que um indivíduo meramente introvertido provavelmente recusaria o convite por ser incapaz de se divertir em tal ambiente, mediante a uma preferência pessoal em atividades menos "estimulantes". Tendo em vista tal distinção um tanto quanto primordial, vale destacar o fato de que pessoas com tendência a características inerentes à introversão (novamente, referenciando a já citada escala introvertido-extrovertido), mesmo em alto grau, não estariam limitadas a elas, podendo também desempenhar comportamentos considerados extrovertidos, à medida que um sujeito tímido (independente de normalmente propender a introvertido ou a extrovertido) não. Uma fácil contextualização do aspecto citado é a habilidade de falar em público, que, por vezes, aquele colega geralmente comunicativo não tem devido a alguma insegurança passível de ser denominada timidez. Na outra extremidade, atributos como tendência em pensar antes de falar algo, desgostar de conversas fúteis, preferir locações e práticas silenciosas etc. denotam bastante a diferença entre introversão e timidez, uma vez que ansiedade e acanhamento (e, portanto, timidez) não são intrínsecos às atividades referenciadas, afinal mesmo alguém extrovertido pode ter algum dos traços mencionados devido, outra vez, à escala introvertido-extrovertido.
Em suma, timidez em demasia ao ponto de se transformar em uma espécie de fobia social que impede a pessoa de desempenhar certas atividades cotidianas (ou em menor grau, mas de maneira ainda prejudicial à realização de determinadas práticas almejadas pelo sujeito em questão) é sim um problema digno de ajuda profissional, todavia ele pode se manifestar tanto em indivíduos com proeminências introvertidas quanto extrovertidas, de modo que tratar introversão em si como algo negativo é certamente um erro. Havendo ressaltado todas essas alteridades, torna-se complicado comparar introversão com extroversão de forma parcial, já que ambas são só características tal qual muitas outras. Na verdade, considerando a peculiaridade de cada caso em virtude das diversas nuances possíveis a partir da anteriormente mencionada escala introvertido-extrovertido, é inclusive meio banal tentar caracterizar prós e contras ou melhor e pior, pois um julgamento dessa estirpe seria completamente subjetivo e, portanto, pessoal; conseguinte, sugestões passivo-agressivas do tipo "você bem que podia tentar falar mais", "sair para se divertir seria saudável na sua situação" etc., quando dirigidas a alguém devido a sua introversão, nada mais é do que pretensioso e inútil. Coagir outros a mudar nunca é saudável, e por que forçar alguém a modificar uma particularidade que sequer está verdadeiramente errada (já que depende de quem julga e do contexto social, que, dependendo do lugar, também é variante quanto a um possível veredicto no quesito "qual o melhor") seria diferente? Mesmo quando nos referimos à timidez ao invés de introversão, um sujeito tímido certamente já sabe dessa característica que lhe acompanha, de modo que tentar repreendê-lo, ou algo parecido, também seria soberbo. O ponto-chave nessas ocasiões está em querer ou não. Se a pessoa, por conta da timidez, deixa de fazer coisas que gostaria de tentar, conselhos recomendando-a ver um especialista são totalmente válidos (infinitamente melhor do que tentar "ser o especialista", inclusive), mas, se esse não é o caso, qual a importância?
Outras referências:
Vídeo que serviu de inspiração inicial: https://m.youtube.com/watch?v=0Zr_4z00hrw
Introversão e extroversão: https://psicoativo.com/2017/01/psicologia-introversao-extroversao.html
Mais sobre introversão e extroversão: https://www.google.com/amp/s/www.psychologytoday.com/us/blog/the-gen-y-guide/201701/the-introvertextravert-myth%3famp
Mais sobre introversão: https://www.google.com/amp/s/www.psychologytoday.com/us/blog/self-promotion-introverts/201302/the-inner-lives-introverts%3famp
Preferi ocultar vários detalhes acerca do assunto, além de não ter mencionado outras perspectivas existentes, prezando assim pela dinâmica e pelo foco do blog. Meu conhecimento não é nem de longe muito aprofundado, mas, nos poucos artigos que li, observei que a temática é consideravelmente complexa e, principalmente, extensa, pois aborda diversas áreas e conhecimentos. De qualquer forma, espero que meu texto não tenha sido uma perda de tempo, acrescentando algo, mesmo que seja só entretenimento.
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